quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Vários dias de novidades e partilhas!

Muitos dias12.08.08
Muitos dias para por em dia, muitos acontecimentos para partilhar!
Preparem-se porque juntei vários dias numa mesma mensagem. Sentem-se e relaxem, que isto demora…
Bem, tento resumir a semana, desde quarta-feira passada até hoje, quarta ao serão.
Ora bem, quinta e sexta lá continuámos nós a grande e boa aventura de engenharia barra arquitectura barra construção. Ou seja, os meus dias são passados na muito digna profissão de trolha, ou de modo melhorzito, ajudante de pedreiro. Pois é, desenganem-se os que acham que se aprende tudo na escola! Nada mais falso! E o que seria da arquitectura sem este trabalho laborioso, aqui, ok, de um modo muito mais manual e “exótico”. Se fosse turista, afirmaria em tom eufórico enquanto disparava com a máquina fotográfica: “oh, so very tipical!”. Mas não sendo turista, mas sim, tendo a máquina fotográfica, passo para o outro lado do lindo quadro etno-antropológico e digo-vos amigos: isto devia ser estágio obrigatório para toda a gente! Pois não é que se aprende muito mais do que seria de esperar? Para além da consistência correcta do cimento, do tamanho da brita (que aqui tem sido restos de blocos e outros entulhos), de como se pisam bem umas fundações, etc etc…, aprende-se a trabalhar em equipa, a perceber por exemplo expressões como “estou a pedir ajuda”, para quando se pede alguma coisa. Parece-vos fácil de entender, mas acreditem que demora um tempo a habituarmo-nos á expressão. As minhas primeiras vezes ficava a olhar, e dizia “hum hum”, e só depois de alguns momentos de risota percebia que era naquele momento que a ajuda era precisa. Aprende-se também como se trabalha em conjunto, repartindo frequentemente as tarefas. Exemplos típicos destes dois europeus latinos: 5 minutos depois de estarmos com as pás, a escavar, um dos papás diz “deixájudár”, e nós damos aquela resposta tão insensata: “nããão, descanse mais um bocadinho que eu agora ainda comecei!”, e insistimos. E só depois começo a reparar num certo ar de desilusão. Mas que raio, eu ainda lhe possibilitei uns minutos extra de descanso, que bem precisa, e não fica feliz? Fica feliz sim, mas se eu deixar ajudar, para daí a 5 minutos trocarmos de novo. Para não cansar muito mano Pedro! Ora pois, que o trabalho se faz em equipa fraterna!
Avanços construtivos: já começámos hoje a colocar as vigas de betão armado e os pilares nos cantos. Temos parede de 4 filas de blocos, ou seja, uns 80 centímetros de altura! Já se vê parede! O estaleiro está cada vez mais modernizado, com carros de mão com rodas que não rodam, e tábuas a servir de cofragem. Viva a tecnologia improvisada! Realmente se vos disser que ao princípio ainda fiquei um pouco expectante, à espera de ver chegar o material…o material necessário faz-se. Os utensílios são objectos de design inteligente, a técnica vernacular no seu melhor. E funciona!
E lá vamos construindo uma casa…Um tanto pequena, é certo, mas é um bom começo.

Férias!!!!!
É verdade, o trolha mulungo ( o trolha branco) teve férias! Do estilo “Pedro vai ver o mar”. lembram-se dos livros da Anita? É mais ou menos assim…
Direcção Maxixe, a Norte. Estrada nacional sempre próximos do mar. Em Quissico, paramos num miradouro e lá está o Índico no seu esplendor, com uma série de baías e reentrâncias, intercalando o mar com coqueiros ondulantes. Parecia um postal! (que frase tão portuguesa, não é verdade?)
A paisagem vai mudando á medida que vamos subindo, e os coqueiros vão substituindo os cajueiros, cada vez menos abundantes. Chegádos a Maxixe já de noite o melhor estava para vir de manhã. Cidade frente a uma imensa baía, luminosa e difusa às primeiras horas do dia, de um azul transparente e um horizonte largo recortado por oceano e coqueiros, ilhas e penínsulas, areais e água transparente. No lado oposto da baía, a cidade de Inhambane, ainda com um ar muito colonial, de pacata vila tropical, sem muito barulho nem movimento. Pela manhã fui até ao cais de embarque de maxixe, onde se apanham os barcos que a ligam a Inhambane. Não pensem nos barcos de tróia nem nos cacilheiros, pensem antes nos barcos que vão às grutas de Lagos. Passeei um pouco na praia a ver o movimento dos barcos, alguns mais pequenos, com velas triangulares, ligeiramente oblíquas e leves, carregando pessoas e mantimentos. Os pescadores, as vendedoras de cocos e mandioca, um casamento pronto para embarcar. A noiva com um verdadeiro vestido de noiva, obviamente branco, e o noivo, de braço dado, de fato obviamente preto, seguidos pelos convidados. Um desfile tirado de um filme, especialmente porque os recém-casados caminhavam com o ar mais triste de toda a gente que ali estava. Disseram-me que as noivas devem fazer um semblante acabrunhado e triste. Nesse caso esta era uma noiva mesmo a sério! E o noivo também.
No domingo fomos passear a Mongué, uma aldeia perto, que termina numa outra enseada igualmente bonita. O caminho é acompanhado pela visão do Índico recortado por algumas pequenas ilhas e uma comprida península. Baixios de areia aparecem com a maré vazia, e a transparência do mar deixa ver o seu fundo, mesmo ao longe. Magnífico!
Talvez sejam os coqueiros os responsáveis pela visão edénica deste cenário. O coqueiro é uma daquelas árvores que nos reportam automaticamente para paisagens tropicais, melancólicas, azuis e verdes, uma vida simples e lenta. Não sei porquê, talvez por em Portugal só existirem nos jardins relvadinhos e limpinhos das cidades tipo rivieras lusas. E por isso a sua visão traz-me memória do longínquo e diferente. A verdade é que por mais que demore o olhar nesta paisagem ondulante e translúcida, parece-me não ver bem o que vejo. Estou mesmo assim tão longe de casa como a paisagem me faz entender? Mas não me sinto longe, sinto-me perto.
Será que sou um coqueiro e não sei? Passadas estas sensações, fico novamente com a impressão de que sou de uma paisagem e de um tempo e lugar que não aquele em que vivo. Que me sinto em casa quando estou longe, porque me sinto perto de outra coisa que me puxa por memórias e me faz sentir um regresso. Será da beleza do local? Será que a beleza é algo tão profundamente essencial na natureza que quando a percebemos sentimo-nos regressar ao nosso lugar na criação? Creio que sim, e é nesta beleza do mundo que me sinto parte da vida que por estes lados teima em continuar, num movimento contínuo de recriação.

13.08.08
De volta ao trabalho!
Acabaram-se as férias e na segunda de manhã lá vimos nós recambiados á grande vila de Manjacaze. Bem, imaginem o grande com um lado algo irónico…porque ao sairmos da estrada nacional voltamos à estrada de terra batida, cor de laranja, com alguns bocados a 3 km hora, devidos aos buracos.
Mas sabem uma coisa? Que bom é voltar a esta casa. E voltar à grande obra em Macasselane!
Grande notícia!: já temos a primeira janela! Quer dizer, mais propriamente o buraco. Já temos uma viga em betão armado completa, e uma das paredes ficou hoje (dia 13) com o buraco da janela. As fotografias virão amanhã!!
Estes dois dias de trabalho têm corrido bem, com uma sessão matinal de encher bidons de 0 litros cada com água para levar para a obra e para as refeições. De cada vez são entre 13 e 15 bidons, e lá para as oito horas, com um céu azul muito azul, e os cajueiros de um verde brilhante, estamos nós a encher bidons. A fonte tem um manípulo em metal, que se baixa e sobe para tirar água. Assim sendo, as manhãs começam com o ritmado barulho da tarefa aquífera, entre árvores e o silêncio da aldeia. Depois, o trabalho continua em força! As paredes vão subindo, o betão armado secando e os blocos recém feitos secam ao sol, em filas paralelas perto do grande cajueiro junto à capela. As crianças ajudam nos intervalos das aulas, carregando água e lenha, e estão já habituadas aos novos habitantes temporários da aldeia.
Tenho muita vontade de conhecer melhor a aldeia, mas o tempo que lá estamos é todo para trabalho, e por isso fico sem possibilidade de passear e ver os vários bairros que compõem Macasselane. Bairros é o nome técnico, porque são pequenos aglomerados de casas, espalhados por entre as árvores. Cada família tem várias palhotas, e existem algumas casas em tijolo. Até agora descobri três lojas! Bem, ok, pequenas casas, muito pequenas casas, muitas das vezes fechadas, e quando precisamos de alguma coisa, gritamos “dê licença”, e alguém acaba por aparecer. Até que gosto disso. Os papás que trabalham connosco são mesmo muito simpáticos, e oferecem-nos iguarias gastronómicas. Sim, amigos, porque quem não trabuca não manduca, e eu tenho manducado mesmo bem (como podem imaginar…).
Ora que ontem, no calor do dia de sol (só tivemos um dia algo nublado atá agora), um dos papás descasca um coco fresco, que é como quem diz, tira com a catana toda a fibra exterior do coco verdadeiramente dito (que está dentro da casca verde), faz um buraco, e eis o milagre! Água fresca, levemente doce! E depois coco ainda mole, tirado com uma navalha. Hum!! Nem conseguem imaginar, eheh. Isto é só para quem trabalha em Macasselane!
Hoje foi a vez da papaia e da chiguinha de cacana. Cacana é uma erva muito amarga, que se cozinha com amendoim e mandioca. Como tinhamos falado que eu já tinha experimentado e gostado muito e o Alessandro ainda não tinha comido, as mamãs prepararam hoje para nós todos. Muito simpáticas! Para além das tangerinas que por estes lados são ligeiramente diferentes das nossas…e do chá a meio da manhã, e da mgumbula (mandioca) cozida, assada ou crua…e da chima… e da verdura com coco fresco ralado no momento e amendoim pilado também ao momento…enfim. Não pensem já mal, porque comemos os que as crianças comem, e isto só prova que estão bem alimentadas, pelo menos ao almoço!
Estou cada vez mais á vontade com os papás, as mamãs e o Alexandre e o Valente, os dois jovens (sim, jovens da minha idade) que orientam a construção. A vida aqui corre bem, e estou muito feliz com este trabalho e principalmente com a relação que vou estabelecendo com a aldeias e as pessoas. Ainda vai dar muito que falar, e muitas dúvidas vão aparecendo. Até porque a vida vai dando muitas voltas, e vocês sabem como isso é verdade na minha vida. Por isso parece-me que algo se está lentamente a formar cá dentro. Vamos ver…Não se assustem, que não fico por cá…pelo menos desta vez…
Bem, tenho muito mais para vos ocntar, mas isso fica para a próxima mensagem, que esta já vai longa. Vou por fotografias e mais texto assim que conseguir ter tudo preparado.
Até breve amigos!

Um comentário:

ritacatita disse...

Com que então o Pedrito (anita) em Moçambique!

vejo que afinal tens conseguido realizar dos desejos últimos da tua mãe, de uma forma muito original - há que saber dar a volta à questão! Queria pedritos e tu não foste indiferente!! Sim senhor lindo menino!

Agora fora de brincadeiras:

nunca tu imaginavas fazer aí um estágio de "aprenda arquitectura construindo"! Agora os empreiteiros jamais te poderão dizer que não percebes nada de obra!!
é pá, e fotos do fim-de-semana paradisíaco nada, né!! Praia que é bom nada de partilhar com os amiguinhos, só fotos da obra para termos pena de ti. Espertalhão!!!!!
Cuida do pedrinho vice,

beijocas
RC